De olho nas metas climáticas e nas exigências do mercado internacional, os maiores frigoríficos do país buscam acelerar a transição para uma pecuária de baixo carbono. MBRF, Minerva Foods e JBS lançaram programas que combinam ciência, tecnologia e incentivos financeiros para reduzir as emissões de metano ao longo da cadeia produtiva e envolver produtores em práticas mais sustentáveis, com metas verificáveis de redução e neutralidade climática ao longo da próxima década.
A MBRF vem intensificando os investimentos em descarbonização da pecuária com o Programa Verde+, criado em 2020 para apoiar produtores na adoção de boas práticas ambientais. Desde então destinou US$ 500 milhões em títulos de transição, e firmou parceria de US$ 37 milhões com o &Green Fund.
O programa atua em quatro frentes: manejo e recuperação de pastagens, integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), melhoramento genético e uso de aditivos alimentares que reduzem de 9% a 12% as emissões entéricas. Segundo Paulo Pianez, diretor global de sustentabilidade e relações institucionais, a MBRF mantém cerca de 8 mil produtores parceiros, com 100% de fornecedores diretos monitorados e rastreabilidade de 90,8% na Amazônia e 88,1% no Cerrado. A meta é alcançar 100% até o fim deste ano, cobrindo toda a cadeia produtiva, da cria ao abate.
“Mais da metade das fazendas fornecedoras já opera com sistemas integrados e confinamento sustentável”, diz. Entre 2021 e o primeiro trimestre de 2024, mais de 4,2 mil fazendas foram reincluídas na base de fornecimento após processos de regularização e adoção de boas práticas.
A idade média de abate caiu de 33 para 29 meses, com rendimento de carcaça 17% maior em relação a 2019. “O Verde+ muda a lógica da pecuária: em vez de excluir quem tem problema, a gente inclui e ajuda a resolver”, afirma. A Minerva Foods aposta em incentivos financeiros para engajar produtores. Criado em 2021, o Programa Renove remunera fazendas certificadas pela FoodChain ID por ganhos ambientais como menor liberação de metano e maior sequestro de carbono.
Com custos entre R$ 1.200 e R$ 12.500 por hectare, o programa reúne 145 propriedades, sendo 31 no Brasil, 108 no Uruguai e 6 no Paraguai. Segundo Marta Giannichi, diretora global de sustentabilidade, a meta é alcançar 50% dos animais adquiridos até 2030 e neutralizar toda a cadeia até 2040. “Um bovino abatido aos 24 meses representa um potencial de redução de 74,4% nas emissões de metano em relação a 36 meses.” As fazendas participantes registraram aumento de 160% a 915% na produtividade e de 500% a 1.700% na renda operacional líquida por hectare.
O peso médio de abate é 12,5% superior à média da empresa, e a idade de abate chega a ser até seis meses menor, o que reduz as emissões. A JBS aposta em tecnologia e assistência técnica para acelerar a descarbonização. O modelo Escritórios Verdes 2.0 reúne iniciativas como Fazenda Nota 10 e Selo Combustível Social e oferece suporte aos produtores.
A companhia investiu R$ 1,2 bilhão em sustentabilidade entre 2021 e 2023 e mantém 23 escritórios regionais que já atenderam mais de 7 mil produtores. Segundo Fábio Dias, diretor de relações com pecuaristas, cada propriedade pode reduzir até 30% das emissões de metano e sequestrar 3,5 toneladas de carbono por hectare ao ano.
A empresa também cofinancia o NeuTroPec, centro de pesquisa do governo paulista que desenvolve tecnologias para reduzir e neutralizar emissões da pecuária tropical. “O foco é mostrar que sustentabilidade e rentabilidade caminham juntas. Quando o produtor melhora a eficiência, emite menos e ganha mais”, afirma Dias. A JBS pretende zerar as emissões líquidas até 2040 e estima que a expansão do modelo possa mitigar 20 milhões de toneladas de CO2 e até 2035.
“O grande desafio é dar escala e viabilidade econômica às soluções de baixo carbono. Nossa missão é levar conhecimento técnico e tecnologia ao campo.” Os avanços dos frigoríficos apontam um caminho possível, mas os desafios de escala e mensuração ainda limitam o impacto da pecuária de baixo carbono.
Para Renata Potenza, coordenadora sênior de clima do Imaflora, o setor privado tem papel decisivo na mitigação do metano, mas as ações ainda são limitadas. “O país precisa de métricas comparáveis e sistemas robustos de monitoramento, reporte e verificação [MRV] para comprovar resultados. O que hoje é projeto precisa virar política setorial”, afirma.
Apesar do compromisso firmado na COP26 de reduzir em 30% as emissões até 2030, o metano segue em alta, segundo o SEEG/Observatório do Clima. Potenza aponta barreiras como resistência cultural dos pecuaristas, falta de assistência técnica e crédito, que ainda travam o avanço de soluções no campo.
“O Brasil tem potencial técnico para cortar até 36% das emissões até 2030, sendo 28% apenas da agropecuária, o que permitiria superar o compromisso internacional. Mas para isso é preciso conectar inovação com política pública e crédito rural”, afirma. O Imaflora apoia o Ministério da Agricultura na elaboração de um plano de aceleração para a agenda de metano, a ser apresentado na COP30.




