Impulsionado pelas culturas de soja, milho e algodão, o ritmo de adoção de técnicas de irrigação está crescendo de forma acelerada no Brasil. De acordo com a Câmara Setorial de Equipamentos de Irrigação (CSEI) da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), o crescimento da área irrigada no país passou de 118.520 hectares (ha) ao ano em 2000, para 370.302 ha no ano passado. As taxas mais altas de crescimento são verificadas na instalação de pivôs centrais, geralmente utilizados para irrigar grandes áreas.
“Há 20 anos, era o feijão que liderava o crescimento, hoje é soja, milho e algodão, por causa do preço das commodities”, diz Everardo Mantovani, presidente da Associação Brasileira de Irrigação e Drenagem (ABID) e professor sênior da Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Minas Gerais.
De acordo com o Atlas Irrigação, lançado em 2021 pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), a área irrigada no Brasil chega a 8,2 milhões de hectares, mas representa apenas 13,24% da agricultura brasileira, de acordo com o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Potencial
Segundo Mantovani, há potencial para crescer mais 55 milhões de ha, sendo 13,6 milhões em médio e curto prazos. “O desafio é desenvolver estratégias e estudos para que haja sustentabilidade nesse crescimento, garantindo o abastecimento da população com alimentos, equilíbrio no uso de recursos hídricos e aumento de investimentos e renda para produtores”, diz o especialista, que estima que a irrigação usa 0,7% da vazão dos rios brasileiros.
O presidente da ABID gosta de se utilizar de analogias com os veículos para comparar com a situação das máquinas. Na década de 1980, ter um carro com ar condicionado era um luxo inimaginável, mas com o desenvolvimento da tecnologia, praticamente todo veículo sai com esse item de fábrica. Para ele, a mesma coisa acontece com os preços das máquinas de irrigação. “A irrigação era muito cara ao produtor. Hoje, com o desenvolvimento tecnológico, é um produto acessível, embora não seja barato.”
Há 20 anos, pensava-se na irrigação como forma de combater a seca, lembra o executivo, enquanto hoje se busca elevar a produtividade. Segundo o Atlas Irrigação, as culturas irrigadas têm produtividade até três vezes maior que aquelas produzidas em sequeiro.
Mantovani cita como exemplo a produção do algodão no Oeste da Bahia, no qual a safra 21/22 apresentou produtividade de 180 arrobas por ha, enquanto a safra irrigada gerou 420 arrobas por ha. “Esse tipo de produtividade paga o investimento na irrigação em um ano só. Imagina a avidez dos produtores de investirem em agricultura irrigada”, afirma.
Os financiamentos, diz o executivo, também estão facilitados. E tanto para grandes investidores quanto pequenos e médios, Mantovani defende o uso de leasing de máquinas, que podem ser adquiridas ao final do acordo. “É uma coisa que boto muita fé. Primeiro, porque o produtor ao alugar a máquina não vai imobilizar o capital dele. E isso pode ser solução para médios e pequenos produtores que podem ter alguma dificuldade com crédito”, explica.
Orientações
O pesquisador Lineu Rodrigues, da Embrapa Cerrados, é um especialista em irrigação e recursos hídricos. Ele conta que os produtores de soja no Mato Grosso, por exemplo, muitas vezes precisam esperar a chuva para começar a plantar. E, com a irrigação, é possível plantar no tempo certo.
“A irrigação propicia antecipar o plantio, você pode tirar vantagens em relação a quem está esperando a chuva. E a grande vantagem a irrigação é como se ela fosse um seguro agrícola, porque reduz as perdas por produtividade. É o melhor seguro agrícola que o produtor pode ter, mais cedo ou mais tarde, e independentemente do local do país que ele estiver”, diz Rodrigues.
A sua primeira dica para o produtor que quer implantar irrigação em sua cultura é encontrar um técnico capacitado para assessorá-lo, porque são diversas variáveis que influenciam a instalação de um sistema. Segundo Rodrigues, o produtor precisa definir qual a cultura vai produzir e quanto de água ela demanda; precisa saber se há disposição de água suficiente na área, ou se precisar construir um reservatório.
“A outra pergunta é se tem energia suficiente disponível para ele. E junto com a demanda hídrica, ele precisa pedir alguma outorga para a sua região? Tem possibilidade de conseguir uma outorga, precisa de licença ambiental para remover a vegetação? E qual é o tipo de relevo e de solo. E em função disso começa a se definir o melhor sistema de irrigação para atender as características dele. É um combinado de coisas que tem para avaliar.”
Área irrigada no Brasil a cada ano por sistema (em hectares)
Ano | Pivô central | Carretel | Convencional | Localizada | Total |
2000 | 47.320 | 25.000 | 16.200 | 30.000 | 118.520 |
2001 | 50.540 | 29.000 | 15.300 | 33.000 | 127.840 |
2002 | 57.820 | 30.000 | 14.650 | 37.000 | 139.470 |
2003 | 59.500 | 30.000 | 15.500 | 40.000 | 147.000 |
2004 | 47.600 | 22.500 | 15.000 | 35.000 | 97.600 |
2005 | 26.600 | 21.000 | 15.000 | 35.000 | 97.600 |
2006 | 17.500 | 30.000 | 15.000 | 30.000 | 92.500 |
2007 | 19.600 | 30.000 | 16.500 | 40.000 | 106.100 |
2008 | 49.000 | 30.000 | 20.000 | 47.000 | 146.000 |
2009 | 49.500 | 25.000 | 17.000 | 40.000 | 131.500 |
2010 | 52.000 | 30.000 | 25.000 | 50.000 | 157.000 |
2011 | 57.750 | 32.500 | 29.500 | 56.000 | 175.750 |
2012 | 84.000 | 32.500 | 35.400 | 60.480 | 212.380 |
2013 | 126.000 | 32.500 | 40.710 | 72.576 | 271.786 |
2014 | 102.000 | 10.500 | 28.497 | 79.834 | 220.831 |
2015 | 78.000 | 6.000 | 28.000 | 75.000 | 187.000 |
2016 | 91.000 | 18.000 | 31.000 | 75.000 | 215.000 |
2017 | 94.000 | 14.000 | 31.000 | 64.000 | 203.000 |
2018 | 92.000 | 13.750 | 31.000 | 64.000 | 200.750 |
2019 | 97.500 | 12.500 | 31.000 | 68.500 | 209.500 |
2020 | 117.000 | 16.250 | 37.200 | 78.775 | 249.225 |
2021 | 206.336 | 28.625 | 37.200 | 98.141 | 370.302 |
Fonte: CSEI/Abimaq
Garantia de rentabilidade
O engenheiro agrônomo e produtor Leandro Munaretto Granella, de Getúlio Vargas, no Rio Grande do Sul, já adquiriu seu terceiro pivô central, com o qual consegue irrigar 20% da propriedade de 310 ha, onde produz trigo no inverno e soja e milho no verão. O primeiro pivô foi implantado em 2019 e, com os ótimos resultados obtidos, Granella buscou ampliar a área irrigada.
“Como nós temos frequentes veranicos e estiagem na nossa região, isso é para garantir uma renda mínima no meu negócio, que me permita, mesmo em anos de dificuldade, ter capital de giro para manter o negócio com boa saúde financeira”, diz ele, que buscará ampliar a área irrigada no futuro, quando os juros dos financiamentos estiverem mais atrativos.
Suas principais orientações ao produtor que tem interesse em investir em irrigação é ter acesso à água, realizar o mais rápido possível as aprovações ambientais sobre o uso da água, análise sobre o fornecimento de energia elétrica e estudar a topografia do terreno, para que o pivô central possa ser usado plenamente.
“Tem que começar a ver a parte de energia e a parte ambiental no mínimo um ano antes que se quer usar na lavoura”, explica ele, que já tinha um açude na propriedade que lhe ajudou na instalação da irrigação. “Demorou nove meses para ligarem a energia, tive que instalar um um gerador para atender a safra de milho, tudo devido à burocracia e a morosidade da concessionária de energia que passa na minha propriedade".