A Comissão de Agricultura da Câmara aprovou ontem um projeto de lei para separar os critérios de produtividade da terra exigidos de donos de imóveis rurais em processos da reforma agrária.
O texto ajuda a reduzir a pressão do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) sobre os produtores rurais pelo cumprimento simultâneo dos chamados GUT (grau de utilização da terra), hoje fixado em um mínimo de 80%, e do GEE (grau de eficiência na exploração), fixado em 100%.
"O conceito de aproveitamento racional e adequado prescinde da eficiência na exploração", disse o relator Cezar Silvestri (PPS-PR). A proposta atinge o coração do conceito de "função social" da terra, considerado cláusula pétrea por movimentos sociais e organizações ligados ao campo.
"O fato de tornar o imóvel rural produtivo, por si só, é capaz de imunizá-lo da desapropriação para fins de reforma agrária", disse Silvestri. "Assim, quando o imóvel atinge o grau de utilização da terra e atende também aos outros requisitos para o cumprimento de sua função social, torna-se insuscetível de desapropriação".
O projeto da Câmara tenta reforçar a posição da bancada ruralista em sua guerra particular para evitar a revisão dos índices de produtividade para fins de reforma agrária. Outros projetos de ruralistas aguardam por votação no plenário do Senado. O texto vai mais além da proposta dos deputados ao submeter ao Congresso quaisquer alterações sobre índices de produtividade. No Senado, a batalha está concentrada na mão de Kátia Abreu (DEM-TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA).
Ambas as propostas têm sido usadas na pressão de bastidores para evitar a revisão dos índices sob o governo Luiz Inácio Lula da Silva. A iniciativa auxilia a posição do PMDB da Câmara, que firmou posição partidária contra essa atualização dos índices do campo. A estratégia foi usada até aqui para salvaguardar o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, das pressões pela revisão. Mas Lula e vários ministros ligados à área social já prometeram diversas vezes que o governo assinará novos índices em breve.
A bancada agrária tentou reagir ontem. O deputado Nazareno Fontelles (PT-PI) apresentou voto em separado, mas foi derrotado. Ele argumentou que, ao exigir somente GEE para o imóvel ser considerado produtivo, o proprietário poderá deixar ociosa extensas áreas de terra. "Um imóvel com 1 mil hectares, onde o proprietário produzisse satisfatoriamente em apenas 1 hectare e deixasse os outros 999 ociosos, não estaria sujeito à desapropriação, o que convenhamos é totalmente desarrazoado", afirmou.
Para ele, "não interessa à sociedade" que o produtor explore intensamente e com excepcional nível tecnológico uma pequena fração de seu imóvel e deixe "expressivos espaços" sem uso, salvo em casos de preservação ambiental. "Não interessa à sociedade também que o produtor rural destine toda sua propriedade para atividade agrária e, no entanto, obtenha produtividade ínfima, inferior ao que seria economicamente adequado". Fontelles argumentou, ainda, sobre a importância do cumprimento da "função social" da terra. "Antes de ser obrigação do proprietário, é direito de toda a sociedade, um direito coletivo".