Com uma produção média de soja e milho que, nos últimos cinco anos, ultrapassou 22 milhões de toneladas, Mato Grosso do Sul enfrenta atualmente um déficit de armazenagem superior a 11 milhões de toneladas. Os dados são de um estudo da Aprosoja, elaborado com base em informações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e do Sistema de Informação Geográfica do Agronegócio (SIGA/MS).
De acordo com o levantamento, a capacidade instalada de armazenamento no Estado é de 16,4 milhões de toneladas, frente a uma necessidade estimada em 27,5 milhões de toneladas, conforme parâmetros da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura). O resultado é uma defasagem de 67,8%, o que obriga muitos produtores a venderem a safra imediatamente após a colheita, sem condições de aproveitar melhores preços de mercado.
A análise da série histórica demonstra que, embora tenha havido avanços, o ritmo de crescimento da capacidade de armazenamento não acompanha a expansão da produção agrícola.
Entre 2014 e 2025, a capacidade de armazenagem passou de 9,01 milhões para 16,39 milhões de toneladas — um crescimento de 82%. No mesmo período, a produção saltou de 17,23 milhões para 29,11 milhões de toneladas, alta de 69%.
Com isso, o déficit de armazenagem aumentou de 8,25 milhões para 12,72 milhões de toneladas, um crescimento de 54%. O ano de 2023 registrou o maior desequilíbrio da série, com déficit recorde de 21,23 milhões de toneladas, reflexo de uma safra excepcional.
Na avaliação do secretário de Estado de Meio Ambiente, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc), Jaime Verruck, os números revelam uma oportunidade de investimentos tanto para produtores quanto para indústrias e cooperativas.
“O Governo de Mato Grosso do Sul tem direcionado esforços para estimular a armazenagem em propriedades rurais, especialmente por meio de linhas de crédito como as do FCO (Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste). O FCO se mostra vantajoso por oferecer prazos mais longos e taxas de juros competitivas, aspectos cruciais para o financiamento de projetos de armazenagem”, explica Verruck.
Para o titular da Semadesc, além do FCO, seria benéfico replicar, em maior escala, modelos de financiamento que existiram no passado, como as linhas de crédito do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) voltadas especificamente à armazenagem. “Atualmente, a construção de armazéns com recursos baseados na taxa Selic inviabiliza economicamente o empreendimento”, comentou.
O estudo apontou que, dos 78 municípios analisados, 73 apresentam déficit de armazenagem. Maracaju, o maior produtor de grãos do Estado, registra um déficit de 1,32 milhão de toneladas, enquanto Dourados é um dos poucos municípios com superávit, com capacidade instalada de 2,35 milhões de toneladas.
A concentração da capacidade de armazenamento também é um ponto de atenção: apenas cinco municípios concentram 49% da capacidade total, mas respondem por 38% da produção estadual.
Projeções e desafios futuros
As projeções indicam crescimento contínuo da produção agrícola, o que tende a agravar o déficit de armazenagem caso não haja novos investimentos no setor. A safra nacional de grãos deve atingir 350,2 milhões de toneladas em 2025, alta de 16,3% em relação a 2024. Por isso, o Governo do Estado aposta em crédito com juros mais baixos, como o do FCO, para incentivar a construção de armazéns.
“É fundamental fomentar o apoio aos produtores, especialmente por meio do acesso a recursos como o FCO. Essa medida representa um caminho promissor para os produtores locais, com potencial para aprimorar significativamente a formação de preços no Estado, configurando-se como uma questão estratégica”, pontuou o secretário.
O levantamento destaca que, sem expansão proporcional da infraestrutura, aumentam os riscos de perdas pós-colheita, os custos logísticos e a pressão sobre o escoamento da produção.
A distribuição desigual dos armazéns e a dependência do modal rodoviário — especialmente ao longo da BR-163 — criam gargalos logísticos e encarecem o transporte.
“A questão da armazenagem está intrinsecamente ligada à logística. A ausência de capacidade adequada impede o produtor de obter preços mais vantajosos. Em suma, ampliar a capacidade de armazenagem nas propriedades rurais é o principal desafio. A falta de espaço força o produtor a vender rapidamente, muitas vezes a preços menos favoráveis”, admite o secretário.
Enfrentamento
Na avaliação do titular da Semadesc, o estudo da Aprosoja/MS evidencia a urgência de enfrentar o déficit de armazenagem para assegurar o crescimento sustentável do agronegócio em Mato Grosso do Sul.
“Apesar do déficit existente, há ações em curso, como o apoio ao produtor rural por meio do FCO e o suporte às cooperativas via Procoop, que visam aproveitar as oportunidades nas áreas de expansão, promovendo o desenvolvimento da infraestrutura de armazenagem. Projetos como a reativação da malha ferroviária, o uso da hidrovia do Rio Paraguai e a implementação da Rota Bioceânica são estratégicos para diversificar os modais e ampliar a competitividade do Estado nesse quesito”, complementa Verruck.
Outro ponto levantado pelo secretário é o processo de diversificação da base produtiva sul-mato-grossense.
“Observa-se, por exemplo, a clara necessidade de expandir a capacidade de armazenagem segregada para diferentes culturas, além da soja e do milho. O sorgo, por exemplo, requer soluções específicas de armazenamento. Portanto, é imperativo ampliar a infraestrutura para atender à crescente diversificação das culturas. A falta de locais adequados, somada à utilização dos mesmos armazéns para diferentes grãos, limita o escoamento da produção”, concluiu.