Fazendeiros acusam Funai de não cumprir lei, manipular e iludir índios
Diego Alves
			
			
			
			“Hoje pela manhã eu estava passando, a caminho daqui, e me deparei com os técnicos que fazem parte do tal grupo de estudo da Funai. Perguntei o que estavam fazendo e me disseram que se tratava da avaliação das benfeitorias da propriedade. Eu questionei a falta do oficial de Justiça e perguntei se eles tinham um mandado para entrar nas propriedades. Me responderam apenas que estão autorizados pelo ministro da Justiça”.
O relato é do fazendeiro Valério Luiz  da Costa Vanni, da fazenda Cambará, entre Sidrolândia e Dois Irmãos do  Buriti, vizinha da Bom Jesus, de 600 hectares, ocupada por índios terena  das aldeias Córrego do Meio e Lagoinha desde a última segunda-feira  (04).
Assim como Valério, outros  proprietários da região estão apreensivos com a situação e temem que um  possível acirramento dos ânimos acabe em conflito grave entre  fazendeiros e índios. Para “garantir a posse da terra”, onze  proprietários da região se cotizaram e contrataram uma empresa de  segurança particular de Dourados. “Não sei ao certo quantos homens são,  mas eles vêm principalmente à noite”, conta Valério.
“Tanto os produtores quanto os índios  estão sendo vítimas de uma política cruel”, assinala Josiel Quintino dos  Santos, assessor de assuntos fundiários da Famasul (Federação de  Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul).
Os fazendeiros apontam ainda a Funai  (Fundação Nacional do Índio) como responsável por incentivar e orientar  os índios para que ocupem as fazendas da região, onde uma área de 17 mil  hectares está prestes a ser demarcada como terra indígena. “Nós estamos  dentro da legalidade e queremos continuar agindo dentro da legalidade”,  afirma Vanth Vanni Filho, irmão de Valério.
A decisão final sobre a questão deve  sair em agosto. Atualmente, um grupo de trabalho montado pela Funai  realiza o levantamento das benfeitorias existentes nas fazendas  incluídas na área a ser demarcada, para calcular os valores das  indenizações aos proprietários.
“A Funai está agindo completamente  alheia à lei e deveria respeitar o processo que está em andamento na  Justiça. Eles estão iludindo os índios com a falsa promessa de que todas  as áreas que estiverem ocupadas serão reconhecidas como pertencentes à  aldeia que estiver no local. E não é assim”, avalia Valério.
O fazendeiro relata também que na  terça-feira (05) os índios chegaram a entrar na fazenda Cambará, mas o  fazendeiro afirma que conversou com as lideranças e “numa boa” apaziguou  a situação e impediu a ocupação do pasto que os índios pretendiam.
“Eles cortaram a cerca em 14 pedaços  para que o gado deles visse para o nosso pasto. Aí eu cheguei. E foi um  pena eu não estar com um gravador, porque quando perguntei a eles por  que estavam fazendo essas invasões, eles responderam que era porque a  Funai tinha dito que as terras que estivessem ocupadas ficariam para a  aldeia”, conta Valério.
Indenização - Os produtores garantem  também que não são “contra os índios”, e reafirmam que o grande problema  está sendo a forma de intervenção da Funai na questão. Com a declaração  das terras como “tradicionalmente indígenas”, o governo não precisa  pagar pela desapropriação, mas apenas indenização pelas benfeitorias.
“Se eles chegassem e dissessem que  precisam da terra por uma questão social, tudo bem, poderíamos negociar,  eles poderiam nos comprar as terras. O que não está certo é declarar  que a terra é tradicionalmente indígena, porque aí não pagam por ela, e  eles mesmos avaliarem unilateralmente as benfeitorias para nos dizer  quanto valem as nossas casas e nos pagarem o que quiserem”, desabafa um  dos fazendeiros.
STF- Os fazendeiros querem também que a  Funai aguarde a conclusão dos trabalhos de um outro grupo, formado pelo  CNJ (conselho Nacional de Justiça) para avaliar os conflitos fundiários  com os povos indígenas em Mato Grosso do Sul. Nesse grupo a Famasul tem  representação e os levantamentos serão apresentados ao Ministério da  Justiça junto com os dados da Funai.
Mas o principal argumento dos  fazendeiros é a decisão do STF (Superior Tribunal Federal), datada de  março de 2009, que estabelece, entre outros princípios, vedação à  ampliação de terras indígenas já demarcadas, que é o caso em questão.  Atualmente a reserva indígena denominada Terra Buriti tem 2,09 mil  hectares oficialmente demarcados. O processo em andamento vai ampliar a  área para 17,2 mil hectares.
Posse - os fazendeiros questionam  também, inclusive na Justiça, a validade dos estudos que reconheceram a  área como terra indígena, abrangendo parcelas de onze propriedades da  região. “Há mais de cem anos meu avô comprou estas terras, pagou ao  Estado, em Cuiabá e no documento original está escrito que o limite é  com terras devolutas. Mas no documento original de demarcação da reserva  consta que os limites são com as terras de fulano, cicrano e beltrano.  Então, quem chegou primeiro?”, pondera Valério.